29/12/2007

O madeiro

No Fundão, alguns dias antes do Natal, um tractor levava grossos troncos de árvore e outra lenha mais miúda, para o largo da Igreja, onde montava uma grande pirâmide em frente da porta principal.
Depois, na noite de Natal, acendiam o "madeiro".
O calor da fogueira reunia muitos homens à sua volta, que cantavam canções ao Menino Jesus, desde a hora do jantar até à meia-noite, quando começava a Missa do Galo.
O frio intenso dessas noites, conhecidas como as do caramelo, por se formar gelo sobre tudo o que esteja ao relento, fazia com que enrolassem agasalhos ao pescoço e esfregassem as mãos depois de as aquecer nas chamas coradas que subiam e se escapavam pelos intervalos dos troncos.
Era a sala de visitas da grande família, que festejava a noite de Natal no Fundão.
Havia sempre protestos de quem habitava nas casas mais antigas em frente da Igreja, pois temiam que as fagulhas que subiam ao céu com a força do vento gelado, deitasse fogo aos sobrados podres e desprotegidos.
Mas nunca deixaram de fazer "a fogueira do Menino Jesus" e nunca ardeu nenhuma casa.
Este ano a fogueira foi pequena, apenas simbólica e por isso não houve canções ao "Meu Menino tão Belo, que logo foste nascer na noite do caramelo".
A Igreja foi restaurada e pintada e o Pároco não quis as paredes enfarruscadas com os fumos do "Madeiro".
Quem sabe se no próximo ano não colocam um artefacto eléctrico no meio do largo, que imite as chamas e substitua o calor, evitando a canseira de transportar os troncos, a paciência para os atiçar e o cuidado para não ficarem braseiros esquecidos nos dias seguintes?
É que agora substitui-se tudo por algo mais cómodo, embora a fingir.
O pinheiro já é de plástico, o gelo que se forma nas madrugadas gélidas é de esferovite, o musgo do presépio é de serradura e o Menino Jesus, dantes em louça fina cuidadosamente pintada, agora é de material sintético, lavável e inquebrável... tudo para ser reutilizável ano após ano.
E tudo o que tornava aquela noite tão comovente, se transforma em objectos "made in China"que se podem ver expostos aos milhares nas lojas dos 300 ou nos chineses que proliferam por todas as terras, mesmo as que não têm posto médico, ou viram fechar as escolas, ou só abrem as portas da Igreja nos dias de festa.
Portugal moderniza-se e perde a identidade. Os jovens do Fundão festejam o Natal mandando emails aos amigos, frente ao computador silencioso que lhes faz companhia serão dentro.
Não conhecem o perfume das ramadas de eucalipto a arder, o som do pinheiro a crepitar e o calor da lenha de oliveira, que em grossas brasas incandescentes iluminam a noite com volteios de cor intensa, como que dançando ao som das canções de embalar sussurradas para adormecer o Deus Menino.

28/12/2007

Quebrou-se o encanto

Seria desta idade, ou um pouco mais velha, quando ficou pronta a casa da quinta e fomos passar lá a noite de Natal. Tinha 10 anos feitos em Junho e frequentava o 1º ano do liceu.
Depois da Missa do Galo, já cansados de tanta excitação para fazer o presépio e moldar os bonecos da massa das filhós, bebíamos cacau quente e comíamos filhós, fatias douradas e outros doces tradicionais.
Antes de irmos dormir, deixávamos o sapato junto da lareira, para recebermos os presentes do Menino Jesus, que só veríamos pela manhã.
Nesse ano, a minha mãe mostrou-me o casaco de veludo cotelé, azul-escuro, que me iria colocar no sapatinho, convencida que eu já não acreditava na magia de um presente caído do céu.
Eu fiquei triste e desiludida.
Não tenho a certeza se acreditava mesmo que era o Menino que nos trazia os presentes, mas o desfazer definitivo daquele encantamento fazia-me sentir que o Natal nunca mais seria o mesmo.
Enquanto todos entravam na encenação da noite de Natal, era como se qualquer dúvida não tivesse razão de ser, como se se diluísse entre os odores da cozinha e as cores dos enfeites. A partir daquele momento, o sonho deixava de valer a pena. Levantara-se o véu e tudo era banal e conhecido, sem brilho e sem magia.
Ainda hoje só me entusiasma festejar o aniversário de Jesus de Nazaré, tal como o do meu filho Frederico, nascido poucos minutos depois da meia noite do dia 25 de Dezembro.
O saco vindo da modista, que a minha mãe abriu e donde tirou o casaco que eu esperava, trouxe também a sensação de que deixara de ser criança e entrava para o mundo dos mais velhos que não se mostrava nada sedutor.

09/12/2007

Casaquinho cintado...

O meu tio era muito vaidoso.
Era bonito e elegante, pelo que alguém o convenceu que era um "astro". Fazia ginástica em casa para desenvolver os músculos e penteava-se constantemente com todo o cuidado para estar sempre alinhado.
Era simpático e cativava quem chegava. Nem sempre agia da mesma forma com os de casa, mas como já está onde se prestam contas, isso agora não vem ao caso.
Como a minha tia era a única irmã, ainda viva, da minha mãe, juntávamo-nos nas datas festivas, como o Natal ou a Páscoa.
Naquele ano, a noite de Natal calhou ser na casa da minha tia.
Jantámos e ficámos por ali a ajudar a fritar as filhós e as fatias douradas, a pôr a mesa, a dar os últimos retoques no presépio.
Agora não é preciso essa desculpa para comprarmos trapos e mais trapos, mas nessa altura era costume vestirmos roupa nova nos dias de Festa.
A minha tia tinha mandado fazer um fato saia casaco para estrear no dia de Natal e colocara-o nas costas da cadeira no quarto.
Na hora da Missa do Galo fomos todos para a Igreja.
Muito frio e muito sono... era o que eu sentia durante a Missa. Arrefeciam-me os pés e o sono teimava em fechar-me os olhos, cabeceando de vez em vez.
A saída tão esperada lá nos acordava e a ceia era mais animada.
Eu, os meus dois irmãos e os meus quatro primos, todos de idades próximas, fazíamos barulho a tagarelar e a rir por qualquer coisa.
A certa altura, a minha tia olhou para o meu tio e perguntou: "Que estás a fazer com o meu casaco vestido?"
Olhámos todos e lá estava o meu tio com o casaco novo do fato saia casaco.
Como era da mesma cor, na hora de ir para a Missa, vestira-o sem reparar que não era o dele.
-"Por isso é que eu me senti tão apertado durante toda a noite!"
Nós riamos e o tio barafustava zangado, só de pensar na hipótese de alguém ter notado o feitio cintado do casaquinho de senhora que usara na Missa do Galo!

02/12/2007

Lua de mel

Esta escapou...
A minha mãe não aplicou a tesoura nesta. Até fico admirada!
A tia Fernanda, está vestida com um fato saia casaco muito elegante.
O tio Hermínio lê o jornal, quadro que me habituei a ver durante anos e anos.
A Amélia devia ter ao colo o Tó-nô... Como era gordo e pesado, a Amélia tinha sempre aquele esforço estampado no rosto.
Não consigo explicar quem é a quarta senhora, sentada ao meio, sobressaindo na coluna branca.
Acho que este passeio a Tomar, foi perto do casamento dos meus tios.
Penso que foi mesmo durante a sua lua de mel.
Se estou certa, gostava de saber que estava tanta gente a fazer com os noivos?

A censura da tesoura!

Mesmo de férias e na praia, como única filha, eu tinha de estar sempre vestida e penteada a rigor. Só o boné destoa!
E tinha fama de mau feitio... pudera, abusavam da minha paciência.
Por isto tudo compreendo agora porque gosto tanto de andar de jeans e t-shirt!
O Tó-nô lá conseguiu escapar, mas o Manel está mesmo com caraça!
E o rosto recortado!!! A minha mãe fazia isto a quase todas as fotos. Quando achava que não ficava favorecida, cortava a cara com uma tesoura e pronto...
Já são poucas as fotografias daquele tempo e as poucas que encontro, ainda estão assim!
Ah! Um último reparo... a camisa de flores! Que chique!!! Seria por causa dela que o Manel estava de trombinha? É que naquela altura, era pouco frequente verem-se camisas havaianas nos "machos". Que pena não se ver a cor... seria cor de rosa?

25/11/2007

Laranjas da Baía

No jardim da quinta havia uma laranjeira, lá ao fundo, à entrada da garagem dos tractores, que na altura desta foto, já tomava corpo.
Enchia-se de flor e tinha 3 camadas de laranjas: verdes pequeninas, médias e já maduras. Tinham muito bom aspecto, tanto em tamanho, como em cor. A laranjeira, no entanto, era brava.
Fora enxertada por diversas vezes, mas os enxertos não pegavam e a laranjeira lá continuava a crescer, a florescer e a carregar de frutos, sem se deixar domesticar. As laranjas apesar de óptimo aspecto, eram de casca grossa, sem sumo e azedas como o vinagre.
O meu pai desistiu de a domar e deixou-a no seu estado natural, pois com o verde da folhagem, o branco da floração e a cor viva das laranjas, enfeitava o jardim.
Todas as pessoas que iam à quinta, mal olhavam a laranjeira, cobiçavam as laranjas. Muitas vezes colhiam uma disfarçadamente e descascavam-na com pressa, para a comerem sem serem apanhadas.
Ao meterem o primeiro gomo na boca, davam um grito, fraziam o nariz, os olhos e a testa, atiravam-no ao chão com pressa e cuspiam tudo entre arrepios de morte.
O meu pai, que observava pelo canto do olho, parecendo distraído, dava uma gargalhada sonora, a que juntava uma ou outra frase engraçada e todos acabavam por rir.
Vezes sem conta este episódio se repetiu e outras tantas vezes nos fez rir com vontade, pelo engraçado da situação e pelo bom humor do meu pai, que se divertia com as coisas mais simples.

13/11/2007

Sem limites...

Sonhava-se sem limites.

As profissões passaram a não ter sexo. As mulheres podiam ser médicas, advogadas, juízes, motoristas de táxi, etc. Tinham queimado o soutien como acto simbólico, mas todos os dias novas conquistas eram feitas. O que parecera um acto escandaloso e leviano, mostrava ser a ponta do novelo.

Os rapazes usavam os cabelos compridos, as roupas justas, as calças boca de sino. Modernices, cabeludos, o fim do mundo... diziam os mais velhos. Os jovens apenas fugiam às convenções e passaram a criar, a olhar a vida com mais liberdade.

Não se escolhiam só os filhos para mandar estudar... as filhas começavam a ser olhadas como tendo direitos também. Casar deixava de ser destino obrigatório e único para uma jovem adolescente.

Não havia ainda escolas, nem transportes, nem posses para se pagarem estudos... mas o sonho começava a poder realizar-se, a tomar formas mais possíveis, a concretizar-se.

O meu sonho foi sempre o mesmo. Um sonho a que chamavam a

Chegaram os Beatles!

Tudo era novo. Tudo era diferente. Começava a brotar a criatividade e a irreverência.
Eu sonhava em tornar-me jornalista. Foi a profissão que mais desejei ter, durante muitos anos. Escrevia em diários, escrevia poesias, escrevia artigos que eram publicados em revistas menos famosas e jornais de província.
Um poema meu encheu totalmente a 1ª página do Jornal de Castelo Branco no dia de Natal.
A música enchia os meus dias e embalava os meus sonhos de poder vir a ser uma escritora.
Chegou a mini-saia. Todas as adolescentes usavam os cabelos compridos e lisos. Os discos e os gira-discos já não eram novidade. E chegaram os Beatles!
Rebentara a... revolução!

09/11/2007

Frio do Outono, calor do amor

Um dia de sol no fim do Outono.
O meu pai recebia os netos, talvez para o habitual almoço de sábado.
A Bagui, toda decidida, caminhava para casa, enquanto o Pedro se ficava pelo aconchego da mãe e do avô.
As dornas que serviram na vindima e estavam a lavar antes de voltarem para a adega, junto das videiras da latada, que esperavam a poda lá mais para o Inverno.
A seguir, o olival, os edifícios do lagar e da adega e bem ao fundo, parte da Serra da Gardunha, assistindo magestosa à mudança das estações.
A pressa da Bagui já se compreende.
A avó tinha sempre umas bolachinhas para "entreter a debilidade", como dizia o avô, que lhe deu um sorriso de orelha a orelha.
O Pedro vem muito bem trajado... calças de fazenda com vinco, camisola de lã e colete sem mangas. Não sei porquê, mas cheira-me a que são tricots feitos pelas vóvós!
Nesta varanda simples, sem luxos, vivemos muitas horas de boa disposição.
Aqui crescemos com o ar puro da Serra, o aconchego da nossa terra e o calor do amor.

Kubitchec de Oliveira

O presidente do Brasil vinha a Portugal e visitava o Fundão, penso que a convite do Jornal do Fundão, um semanário com tradições de luta antifascista.
Eu tinha então 13 anos, estudava interna no colégio de religiosas Doroteias, na Covilhã.
Nada sabia do Brasil, nem do seu presidente e muito menos do que representava o Jornal do Fundão na vida política da minha terra.
A verdade é que as Doroteias, freiras educadoras, iriam festejar a vinda de tão ilustre personagem à Covilhã, uma vez que era à porta do colégio que o carro do visitante parava e iniciaria o percurso a pé, até ao pelourinho, onde faria um discurso.
Resolveram escolher uma menina entre as alunas, que iria entregar um ramo de flores ao presidente brasileiro e apresentar os cumprimentos do colégio.
Foi cuidadosamente enfeitada a entrada, mandadas vir as alunas com o uniforme dos domingos e encomendadas as flores. Depois foi escolhida a aluna que iria entregar as flores.
Fiquei admirada quando me escolheram. Ainda hoje não sei qual o critério que seguiram.
Na hora da chegada da comitiva, fomos todas perfiladas à porta do colégio e eu fui colocada ao meio, com as flores nas mãos.
Durante a espera, todas as minhas colegas queriam saber porque fora eu a escolhida e eu, ingenuamente, quase lhes pedia desculpa.
Depois de grande espera, com muita gente amontoada nos passeios, lá começamos a avistar os carros a que as pessoas acenavam com entusiasmo.
Nervosa, endireitei as costas e pus o meu melhor sorriso.
Os carros pararam mais à frente do que o que tinha sido estipulado e a multidão correu atrás.
Eu fui empurrada pela rua acima, com as flores na mão e sem quase pousar os pés no chão, por aquela gente toda, que queria ver e chegar perto do presidente.
A meio da subida para o pelourinho, lá me consegui libertar e sair da torrente que seguia os visitantes. Tinha perdido as flores e encontrado duas amigas que tinham sido também arrastadas e vinham divertidíssimas.
Resolvemos aproveitar aquela pequena fatia de liberdade e ir ao café Montalto comer um bolo e beber um sumo. Juntámos o pouco dinheiro que tinhamos e fizemos um lanche maravilhoso, com aquela multidão a fazer de cortina e o som dos discursos inflamados como música de fundo.
Por fim, lá resolvemos voltar para o colégio. Calámos a nossa aventura e fizemos alarde da desventura de termos perdido as flores e não termos conseguido apresentar as homenagens programadas.
Qual o meu espanto, quando no domingo seguinte, na 1ª página do Jornal do Fundão, lá estava a fotografia do presidente, a sua comitiva toda e nas mãos de uma das pessoas, o meu ramo de flores...
Vezes sem conta, nestes anos todos, dou por mim a pensar como teriam ido parar às mãos daquela pessoa, as flores que perdera nos empurrões pela rua acima.
Ainda pensei na hipótese de 2 ramos exactamente iguais... o que era bem difícil.
O melhor de tudo foi o lanche no Montalto, às escondidas das freiras.

Tempos de partilha

Apesar de ter vindo da aldeia sem um tostão no bolso, com ideias novas e muito trabalho, acabou por ser uma das pessoas mais importantes do Fundão, pelo seu poder económico.
A sua origem humilde e o seu bom coração faziam com que ajudasse quem tinha sido menos bafejado pela sorte - continuo a acreditar que a sorte também tem muita importância na nossa vida - e a ele recorria para empregar um filho, para ser fiador num empréstimo, para emprestar mesmo uma quantia que resolveria um momento de aflição.
Era um grande empresário já, quando tomei consciência da amizade que o ligava ao meu pai e da forma como ajudava os outros.
Um dia, andando muito doente com uma úlcera varicosa numa perna, que o fazia sofrer horrores, atendeu no seu escritório uma mulher que lhe ia pedir ajuda, como era hábito.
A mulher era muito humilde e para tentar agradar ao senhor que tinha a solução para o seu problema, começou por lhe perguntar pela saúde. Ele lastimou-se do seu sofrimento. Ela, ainda a tentar agradar, disse-lhe:
-Mas tem tão bom aspecto.
Ao que ele respondeu -Pois é, mas eu não me queixo do aspecto!

29 numa cama

Na quinta, o meu pai tinha um trabalhador rural que o ajudava há muitos anos e era quem orientava os outros, na sua ausência.
Era natural de Valverde, a aldeia onde nasceu a minha avó, mãe da minha mãe.
Quando vinham novos trabalhadores ou visitas à quinta, ele brincava dizendo que na sua casa dormiam 29 na mesma cama. As pessoas olhavam-no com surpresa, sabiam que era brincadeira, mas tentavam descobrir o que ele queria dizer.
Nunca sorria e continuava a afirmar que era verdade o que dizia. Na sua casa dormiam 29 na mesma cama.
Quando as pessoas mostravam vontade de saber como é que aquilo era possível, ele explicava:
- Eu sou Catorze, o meu filho também é Catorze... já somos 28, mais a minha mulher, somos 29.
Era um homem à moda antiga, como dizem lá no campo. Não é que já não haja homens honestos, humildes e fiéis àqueles para quem trabalham, mas havia uma ligação afectiva tão forte, que os interesses fundiam-se, parecendo que o principal interessado que a vinha produzisse ou o pomar florescesse era também o encarregado e não só o patrão.
Era habitual, para mim, ver o meu pai conversar com o Sr Catorze, analisando as decisões a tomar, numa harmonia e cumplicidade que transpirava não só respeito mútuo, mas também amizade.
Sinto imensa vontade de procurar em Valverde por esta e outras famílias que povoaram os dias da minha infância e deixaram marcas de sentimentos fortes e únicos.

26/09/2007

Tudo começou aqui para mim e a minha geração!

Depois foi muito alucinante...

Elvis, Beatles, Rolling Stones...

Cabelos compridos, make love not war, S. Francisco e flores no cabelo... O tempo voou.

25/09/2007

carros...

As gincanas na avenida do Fundão, estão longe da minha memória. Sempre ouvi falar delas e só lembro vagamente o reboliço dessas alturas.

O pai participava e arranjava sempre par para fazer equipa.

A assistência tão murchinha... a criança, o polícia... tudo tem a ver com as provas desportivas em velocidade e as corridas na ponte Vasco da Gama altas horas da manhã, de agora!

O BL-12-12, era um espaaaanto!
As meninas de soquete branco e blusa chegadinha ao pescoço, manguinha de balão, joelho tapado, na maior decência, também se parecem com as adolescentes de agora, com roupas tão pequenas que mais parecem não ser delas, sugerindo muito e resguardando pouco, numa atitude de descontraída de provocação.
Acho que nem oito, nem oitenta...
Aqui, a geração seguinte.
Filho de peixe...
Os carros, sempre os carros, na vida do meu pai e do meu irmão Manel.
O autódromo do Estoril, pelos anos 70, os mini na berra.
Umas vezes o 4, outras o 44... tempos de sonhos e devaneios!

22/09/2007

Raízes

O Fundão é terra de boa gente, que também atrai
para o Fundão gente boa.

Há costumes que se mantêm e que são levados pelos Fundanenses para longe e recordados com carinho, anos e anos.
Quem nunca tomou café no Cine, leu o jornal na sua esplanada ou apenas conversou com amigos e viu passar as modas?
A sombra das tílias apazigua o calor do verão e torna sala de convívio esta avenida tão acolhedora.
Os jovens, mais familiarizados com as novas tecnologias, preferem a solidão do seu quarto para uma conversa na sala de chat.

Não conhecem com quem falam, não a podem tocar, nem ver ou ouvir as suas gargalhadas, na maioria dos casos. O cine proporcionou muito mais que isso toda a sua vida. Encontros, namoros, amizades, cavaqueira apenas. Mas tudo ao vivo e a cores... a fazer bater mais forte o coração!

.A Igreja... Baptizados, casórios e velórios, claro, juntam aqui as pessoas.
As amigas e as conhecidas...
No Natal, é o madeiro o anfitrião.
As canções ao Menino Jesus estão cada vez mais tímidas, mais esquecidas, mas no frio gélido das noites de Natal, o madeiro regala os olhos e junta os cristãos.
Os sinos são gritos de aviso que se ouvem ao longe. A Igreja é o coração do Fundão, o centro, a mãe.


O jardim e o casino. À direita, a casa dos Maias, hoje belíssima residência de Turismo.
Era aqui que todas as noites, no Verão, quando eu era criança, corria e saltava até ir para a cama.
No casino, nos bailes de Setembro, muito dancei...
Acho que o fiz pelo resto da vida, pois nunca mais tive como satisfazer essa minha paixão.
Lá ao fundo, está a Igreja e deste lado, a Câmara
Municipal.



O Parque das Tílias, tão conservador e diplomata- não fosse a propaganda política a estragar a sua harmonia fotogénica-lembra-me a minha mãe a fazer renda, acompanhada das amigas, nas tardes de calor.
Fala-se das doenças, dos médicos, das consultas, dos tratamentos.
.
E a tudo isto podemos acrescentar os biscoitos da Mª Joaquina, as filhós da Amélia, as papas de carolo da mãe, as pataniscas de bacalhau-as melhores da Terra- as cherovias fritas, os peixinhos da horta, o esparregado de vagens e o azeite... o azeite delicioso que faz o bolo da Páscoa e tempera as couves com batatas na consoada.
Não é só o queijo de ovelha, não são só as cerejas... São as tílias em flor, as oliveiras dobradas ao peso da azeitona, os bombos de Lavacolhos, o Rancho de Silvares, as castanhas do Souto da Casa, as trovoadas, as geadas, os turistas da Serra...
São as sirenes dos bombeiros e o céu nublado com as cinzas dos fogos.
Sãos os sabores, os odores, as preces e as dores. As raízes que me sustentam.

17/09/2007

O campismo

No parque de campismo do Fundão, o Paulo e a Maria Eduarda foram visitados pelos meus pais, pela tia Salete e pela amiga Tila.
Apesar de estarem no campo, as senhoras não dispensaram os colares e os brincos...
O Paulo brinca com o fotógrafo.
O pai, o Paulo e a tia Salete partiram e esperam por nós do outro lado.
A sua ausência tirou a vontade de fazer campismo aos que ficaram.
Mas a vida continua... e recordar é viver!

O Paulo

O Paulo era o filho mais novo da Mimila.
Estudioso e muito calado, era o mais sisudo dos três.
Foi para Angola fazer o serviço militar e ficou lá a trabalhar num cargo importante que lhe ofereceram.
Voltou casado com a Maria Eduarda e com dois filhos muito lindos- A Paula e o Pedro.
Voltou sorridente, com uma disposição que só a felicidade consegue dar.
O Paulo foi sisudo e voltou feliz! A foto mostra bem.

16/09/2007

O Zé

O Zé, o filho mais velho da Mimila, casou com a Rosa Maria, a quem namorava já há muitos anos e foram viver para Mirandela.
Tinham comprado uma escola de condução, casado, montado a casa... o dinheiro era pouco, mas como o amor era grande, o entusiasmo não faltava.
Nascera a Ana Cristina e a Rosa Maria ainda estava um tanto combalida. Então o Zé, acendeu a lareira, colocou um cobertor numa cadeira, foi buscar a Rosa Maria ao colo e sentou-a ao quentinho.
Antes de ir trabalhar, no entanto, foi buscar ao quintal um caixote de papelão, colocou-o em cima da lareira, o buraco para a frente e disse: Fica aí sossegadinha a ver televisão. Eu já volto.
Nessa mesma manhã, a Rosa Maria teria de ir pelo seu pé despedir-se para sempre do marido, vítima de um acidente de viação. A vida!

A Teresa

Aqui, a Mimila com a Teresa, a Rozarinho e uma outra criança, que não conheço o nome.

O Zé, O Paulo e a Teresa, os 3 filhos da pessoa mais adorável que existiu à face da Terra- a Mimila.

O Paulo e o Zé já estão com ela.

A Teresa continua a acarinhar a filhota, já adulta.

Como deve sentir saudade da mãe!

15/09/2007

A Lena

Se há fotos que me fazem rir, esta é uma delas.
A casa da quinta estava em construção e a minha mãe foi até lá com as amigas.
A Tereza tem um chapéu de morrer...
Se fosse agora, dizia que o tinha comprado nos chineses, mas naquele tempo, o único chinês de que há memória no Fundão era um que vendia gravatas... não chapéus!
A Lena tem uma farpela, que valha-me Deus!!! Deve-se ter molhado e a minha mãe vestiu-lhe as cuecas, vá lá saber-se de quem! Ou então preparava-se para tomar banho no tanque e esse foi o único biquini que estava por perto... Aliás, monoquini.
E ainda há mais uma.
A Lena, descalça e com a tal fatiota. Ela tem de mostrar esta ao neto, ao César.
A Milau, a amiga brasileira da Covilhã, lava um trapito para posar para a foto.
A mãe, com um chapéu e peras.
O meu pai, pensativo. Pudera! Fazer uma casa daquelas, naquele tempo...
A casa, a quinta e as pessoas... Como o tempo passa!!!

Angola


O Manel não quis tirar a fotografia fardado.
Cozia os botões com fusível de electicidade, passava as calças colocando-as debaixo do colchão durante a noite, enfim, devia ser por isso que para a pelingrafia vestia a jaja do domingo.
Repare-se na pulseira de prata à Roberto Carlos... Um chiquê!!!
Saudades, saudades, é a cinturinha... Ai, ai. Que suspiro tão fundo! Onde estará ela que já não a vejo há séculos...
A foto tem uma legenda atrás
"Sá da Bandeira, 23.10.1970
O Sá não quis ficar na foto.
Manel"
E pronto. Aqui fica para recordar.
(Nem ganhavas para um cinto!!!)

As madrinhas de guerra

Os nossos rapazes partiam para o Ultramar e nós ficavamos a pensar neles...
Então começaram as cartas para trás e para diante.
Mas havia rapazes que não tinham amigas a quem escrever, ou tinham poucas e queriam ter muito correio para ler quando voltavam do mato.
Alguém se lembrou das "Madrinhas de Guerra".
Eles escreviam para um jornal ou para uma revista e pediam uma madrinha. Nós respondíamos.
Às vezes dava certo e nascia amizade, até casamento. Outras vezes não dava nada.
Mas, aliadas às cartas, passaram a estar as fotos.
Tiravam-se fotos para mandar para a frente de batalha e recebiam-se fotos de mancebos fardados, em terras tão distantes.
Eu adorava escrever e receber cartas, como todas as miúdas da minha idade. Longas, umas engraçadas, outras melancólicas, de escrita cuidada, representavam muitas horas de partilha!
Claro que tinhamos de mandar a fotografia da praxe no fim dos primeiros contactos. Fotografias que tiravamos umas às outras, com todo o estilo que as máquinas permitiam.
Esta foi uma delas. Com 14 ou 15 anos, com todos os sonhos por realizar, fazia sonhar os militares que lutavam numa guerra que não queriam, não entendiam e não mereciam.
Muitas histórias aconteceram e poderei contar algumas. As que não me pertencem, continuarão anónimas, mas nem por isso menos verdadeiras.
Acho que no coração dos antigos militares da guerra do ultramar, estão guardadas com carinho as lembranças das suas madrinhas de guerra.Mesmo já sem nome, nem rosto.

A escola há 70 anos!

As fotos da escola, com a professora, não são moda nova!
As miúdas, já espigadotas, com cara de terem feito a 4ª classe, posam para o álbum das memórias. A minha mãe, atrás da professora, com a sua figura esbelta, que nunca perderia.
E se não fosse esta maravilha da ciência, quem se lembraria agora destes tempos, destas caras, como a da D. Beatriz Serôdio, que é tal e qual a da Cila, a sua filha mais velha, ou de outras que reconheço as feições, mas não lembro o nome?
A roupa do domingo, talvez a do exame da 4ª classe, cabelos bem penteados e lá estão elas, escada acima, como era costume...
Há ali umas mais pequeninas, que se adiantaram ou então frequentavam outras classes, na mesma sala, como ainda hoje se usa fazer.

26/08/2007

Saiotes e folhos

Haverá figurinha mais tristota?

Na praia, debaixo do toldo, no calor do mês de Agosto, eu... completamente enfarpelada com saias e bibes de folhos, cabelo penteado, borboleta engomada e...pés descalços.

Como é possível fazerem uma coisa destas a uma criança?

Sentarem-na ao sol, vestidíssima, penteada e pronta, uma vez mais, para ficar horas a olhar para o sol.

Não havia ninguém por lá com sensibilidade para partir a máquina fotográfica?

Que bom ter um fato de banho pequenino, correr na beira do mar, brincar na espuma salgada da rebentação das ondas e fazer castelos na areia, com as formas de conchas e peixes... gozar a natureza em liberdade.

Detalhe...

Não resisti à tentação de voltar a esta colecção de fotos, que acho um espaaanto.
As franjas estão bem escovadas e o risco ao lado é regra para todos.
O sol nos olhos... a câmara que não faz o clic da praxe...
Quando estava quase, esperem!
O Manel pede água. Alguém vai buscar um copo rapidamente e a mãe, como assistente, refresca a garganta do artista. Era preciso aguentar o tchan que se conseguira para uma foto tão especial.
O Tonô nem acredita na falta de profissionalismo... ou melhor, nos caprichos do vedetismo. Eu continuo a esgrimir com os raios brilhantes que teimam em me fazer correr as lágrimas...
Francamente, Manel! Sempre a fazer-nos das tuas.

21/08/2007

O vício...


Tenho sentido a falta de escrever as minhas lembranças, de me sentar e viajar calmamente através das letras que se agrupam e planam nas "brumas da minha memória".

Divirto-me e sinto-me menos só, recordando as pessoas que caminharam a meu lado, ou se cruzaram comigo nesta estrada da vida.

Tem sido dificil conseguir um pouco de tempo para mim, tempo que ainda divido com o robedesoir.blogspot.com, onde também deixo alguns gatafunhos.
Só me conformo quando visito os blogs de amigos e vejo que estes também têm avançado muito lentamente, embora por outros motivos... férias, passeios, amigos e esplanadas. Ainda bem.

A mim faz-me falta estar em sossego e escrever. É tarefa que não me cansa. Não sinto fome, sono ou cansaço. Não sinto o tempo passar. É já um vício.

Desde muito pequena que não sei andar sem papel e caneta... sinto-me despida, perdida, inquieta, mesmo que não escreva nada.

Mas se não conseguir escrever dez palavras seguidas sem me interromperem, também fico impaciente e chata. Imprópria para consumo, intragável.

Assim, mesmo com vontade de voltar às minhas fotos e aos meus comentários de chacha, é preferível adiar.

Também tenho chegado cansada do serviço, onde muitas colegas estão de férias.

É assim... já deu para me abstrair das "Chiquititas" que a esta hora enchem de vozes esganiçadas a minha sala, tão habituada ao silêncio...
Por causa delas só me chamaram duas dezenas e meia de vezes numa hora!

16/08/2007


15/08/2007

Manel

O bairro de Londres, os cabelos compridos, a barriga ausente e o futuro a adivinhar-se...

Vê só que maravilha andares na net com uma cinturinha que mede metade da largura dos ombros...
Será que com esta imagem conseguirei chamar-te a atenção e pedir-te que me tragas a malinha das fotos da mãe?
Quero copiar outras que me lembro de ter visto, mas que não tive tempo de tirar.
O meu stock está esgotado e só tu me podes ajudar.
Bom, acho que se as tuas fans desse tempo te vissem aqui, desmaiavam de emoção.
A São devia pedir uma indemnização. A mercadoria que adquiriu, não corresponde há que possui. As provas são evidentes... ganharia de certeza! Um beijo.

Os pais


A "love generation" começara aqui...
Não se herdam apenas as casas e as terras, mas também os hábitos, os gostos, as tradições, os sorrisos, os afagos e os sonhos.

Parte da "Love generation"

O pobrezinho do Kid tem mesmo vida de cachorro!!!
O maravilhoso sorriso da Bagui, que deixa envergonhadas as rosas do canteiro,só por si, cura hoje muitos doentes nos cuidados intensivos do Hospital de Stª Maria .
O Kiko, que finalmente deixou lavar o equipamento do Belenenses e que não perde de vista o pequeno animal indefeso, é hoje perito em novas técnicas da comunicação.
O Pedro, não dando descanso ao recém nascido Serra da Estrela, já a dizer mal da vida dele, defende causas em Tribunal. Quem sai aos seus...
A Rita, com um dom especial para o design, chega até nós constantemente através do pequeno ecran, dos outdors e das publicações onde brilham os seus trabalhos publicitários, além de cuidar da sua família com tanta dedicação como aqui dos seus irmão e primos.
Há mais... felizmente.
Falta a Bebé e o Bernardo.
É mesmo a "Love generation"

14/08/2007

O amuo

Em frente à capoeira das galinhas encontraram finalmente o lugar ideal para fazerem o registo fotográfico!!!
A Tereza sorri de cabeça baixa, talvez temerosa da grande responsabilidade de foto tão criativa.
Eu rio-me. Sentarem-me em máquinas esquisitas era costume muito antigo. Até já achava graça.
Quem perdeu o sorriso foi o Tonô... Pudera!
Por mais paciência que se tenha, chega o momento em que se esgota...
Ser tirado da brincadeira, lavar a cara, pentear a franja, sentar a olhar para o sol e esperar para ver o passarinho que nunca chega a aparecer, não é fácil.
A Tereza e a Mimila, presenças constantes e afectuosas na minha infância...

Veículos... e laços.

Tanto que eu gostava de ver a rua atrás...

Não consigo entender porque tinham que anular o cenário natural em cada fotografia que nos tiravam. Desta vez com um casaco comprido...

Tinham ideias persistentes. Fazer o registo para a posteridade em cima de um veículo (motorizado ou quase), era uma delas.

Quase caio da "bruta máquina", que ameaça tombar para a esquerda, mas mantenho a pose. Começava a habituar-me, a tomar-lhe o jeito.

Ainda se podia conduzir sem capacete e sem carta de condução, mas o mais difícil era fazê-lo sem chegar com os pés aos pedais.

Agora compreendo porque ainda não gosto de ser fotografada!

13/08/2007

Como o luar...

Cá está o Pedro de novo.

Esta foto é para a "Julieta" dos olhos cor do céu e dos cabelos de ouro...

Já então era "moço bonito" de morrer!

Anafadinho, como se tivesse sido picado pelas abelhas. As mãos, as bochechinhas...

Inchados, os dois, pai e filho, de um amor tão belo como o luar, tão quente como o sol, tão forte como o vento, tão profundo como o mar, tão generoso como o sonhar, tão livre como o pensamento e tão constante como o tempo.

Os amigos



Os filhos dos nossos amigos... amigos são!
O Paulo e a M.Eduarda vieram visitar os meus pais e os seus filhos - Pedro e Paula- passaram logo a fazer parte da tribo.
Tempos de férias, de vida ao ar livre, de descontracção.
Quem consegue imaginar o que nos está destinado, o que vem a caminho?
Que pena o tempo passar tão depressa e trazer tantas coisas que não esperamos, que não desejamos, que não merecemos.
Que pena...

A alegria

As latadas cheias de uvas maduras que seriam vindimadas em Setembro, no fim do Verão, faziam sombra para as correrias em bicicleta, as passeatas em que as crianças trocavam os novelos feitos de fios dourados da sua imaginação.
Foi assim connosco, foi assim com os nossos filhos... quem dera que seja assim com os nossos netos!
Não precisavamos de televisão, de Mcdonalds, de sessão da tarde no cinema do centro comercial.
Os abraços eram dados pelo pai, pelo avô, pelos mais velhos, sem olhar à quantidade, sem regatear a qualidade.
As atenções, os mimos, os doces e os bolinhos eram uma constante na mesa fazendo companhia ao leite e ao pão com manteiga.
Nas férias, os primos cresciam juntos como se fossem irmãos e os amigos como se fossem primos, os conhecidos como se fossem amigos.
Crescia-se a cada vez que se enchiam os pulmões de ar puro, a cada corrida, a cada jogo.
Não me lembro das lágrimas, da solidão, do abandono, da tristeza.
O sorriso da Bagui e do Kiko não deixam dúvidas... Era a alegria!

Ao banho!

O tanque da roupa era uma tentação!

Acabado de encher com água da nascente, era irresistível de tão transparente, mas... gelada.
Os "pirolitos" não continham cloro.
A barriga encolhia-se com o frio e os dedos ficavam encarquilhados e roxos.
Mas até isso fazia parte.
A brincadeira estava sempre por ali, à esperade ser parceira...
Mesmo assim os dois primos inseparáveis mergulhavam sob a vigilância "arrepiada" da Rita.
Desta vez não era o Pedro, mas a Bagui.

A respiração continha-se e os risos só se soltavam depois, quando recompostos do choque.
Nunca havia constipações.
Como o sol era quente, bastava subir as escadas a saltitar (por causa das areias mais grossas que se espetavam nos pés) e ao chegar à varanda, já se estava em forma outra vez.
Então vinha o lanche da avó... e o apetite também não faltava.
Quando alguns garotos de Lisboa nos davam rótulos porque éramos da "província", falávamos "achim" e não conhecíamos cinemas, transportes ou lugares como eles, dávamos-lhe razão e desejávamos ir para a cidade o mais depressa possível...
Que imagem tínhamos da vida das cidades!
Eu adorava ver Lisboa à noite, com toda a iluminação colorida dos cinemas e prédios de grandes empresas.
Parecia-me tudo muito alegre, as pessoas muito apressadas davam-me a ideia de ser todas felizes, os transportes cheios faziam-me acreditar que andavam todos a passear por gosto.
As lojas com fatiotas ousadas, os restaurantes cheios, as pastelarias com pessoas em pé, pareciam sempre numa festa.
Depressa pude ver a realidade.
A sonolência de quem viajava nos autocarros pouco tinha a ver com o cansaço dos fins de festa e os rostos dos mais apressados transmitia tanta impaciência, tanta raiva, que ao mínimo contratempo explodiam em impropérios e desespero.
A nossa infância vinha-me então à memória como um período maravilhoso, que nos dera uma estrutura tão forte, como as montanhas que observavam quietas o nosso crescimento.

09/08/2007

As colegas

As minhas colegas de escola... A Ana Maria, a São,a Elvira, a Tereza, a Mizé, a Isabel Rosa e outras.
Ontem foi o aniversário da "Menina Lurdes", como chamavamos à contínua que está na foto connosco, lugar que deveria ser ocupado pela professora. Completou mais de 80 anos...
Foi uma presença constante na vida da escola primária e embora actuasse com autoridade, ainda hoje sinto muito carinho por ela.
Lembro-me do 1º dia em que fui à escola.
A Amélia foi-me levar. Subi a Rua da Cale muito orgulhosa da minha bata branca e muito temerosa do desconhecido. A companhia da Amélia dava-me alguma confiança, mas eu ia com o coração a bater forte.
À entrada da escola havia um hall e uma escada para o 1º andar, que subi pela mão da Amélia. Lá em cima, à porta da sala, estava a menina Lurdes, que encaminhava as crianças da 1ª classe para os seus lugares, pois a professora ainda não tinha chegado.
A Amélia parou a conversar com ela e eu não lhe larguei a mão.
A menina Lurdes puxou-me pelo braço, fazendo-me separar da mão que me confortava e empurrou-me para dentro da sala, sempre a falar com a amiga.
Entrei de rompante e sentei-me. A sala estava cheia e eu fiquei envergonhada.
Foi nessa sala que fiz os 4 anos de ensino primário e estas foram as minhas companheiras de estudos e brincadeiras. Eu sou a 1ª do lado direito, de joelhos, com saia de xadrez e blusa com laço. A minha mãe tem uma foto idêntica com a sua professora e os meus filhos também...
Mudam os tempos, mas não mudam as fotos!

A infância

O Pedro diz-me para não ser preguiçosa...
Ele tem razão, não tenho tido vontade de escrever.
Veio a minha mãe passar o mês de Agosto a minha casa e sempre que me vê em frente do computador, chama-me para dizer qualquer coisa. Fala-me de pessoas do Fundão, que eu não conheço, ou se conheci, já não tenho qualquer ideia de quem sejam. Como mostro gostar de saber essas novidades, tenta contar mais. Sempre que recomeço a escrever, volta a querer a minha atenção. Preferi fechar o computador e evitar ficar impaciente com as interrupções.
Para o meu sobrinho Pedro, "moço bonito", (como diria Jorge Amado em "Gabriela"), faço hoje serão e lembro a sua infância na quinta.
Na foto, o Frederico e o Pedro.
O Frederico, o meu filho, com o equipamento do Belenenses, o nº 1 nas costas a seu pedido, que adorava e vestia todos os dias. O Pedro, de pés no chão, mesmo contra a vontade da avó (por causa do perigo de se cortar num vidro ou espetar um prego) a piscar os olhos, para manter a tradição. O cachorro Serra da Estrela, com pouco mais de um mês de idade, arreado de tantas festas.
A quinta era o paraíso para todos nós.
Os cães, as galinhas, os coelhos e os gatos. A água, a terra, as pedras, as árvores e o céu.
O espaço... a liberdade.
Já tinha sido para mim e para os meus irmãos. Era para os meus filhos e para os meus sobrinhos da mesma forma.
No ribeiro ao fundo da latada, fazíamos regatas com cascas de nozes e pedacinhos de cana.
A nogueira e a nespereira, no meio do jardim, eram os nossos castelos e os monte da areia que sobrara de uma obra, tomava um sem fim de formas, que alimentava a nossa imaginação.
Os arbustos que a minha mãe mandava podar com feitios elaborados, eram os esconderijos para os cowboys, que se alvejavam de surpresa com pistolas de pau.
Agora, tudo se repetia.
Tomavam banho no tanque da roupa, com água saída da nascente, gelada e transparente.
Faziam bigodes com as talhadas de melancia, que tingia as roupas e deixava as mãos meladas do açúcar.
Para o Frederico, qualquer pauzinho servia de pistola e os tiros, sons que fazia com a boca, chegavam a fazê-lo babar-se com tantos que disparava seguidos.
Os cães, tão respeitados por quem se aproximava da quinta, eram uns "borrancanas" nas suas mãos. Podiam fazer-lhes tudo, que eles não se afastavam, nem se rebelavam.
O Verão era uma aventura cheia de sol, ar puro e coisas boas.
Hoje, já homens, em vez de jogos e correrias, os meus Romeus fazem juras de amor, embora de forma mais descontraída, mas igualmente apaixonada, às suas Julietas de cabelos de oiro e olhos cor do céu. Adivinha-se uma nova geração...

23/07/2007

Em Maio

Cerejeiras em flor.

Quando a neve e a geada se despedem, rebentam as folhas novas, bordando a matiz as encostas da Serra.

Depois, com os primeiros raios de Sol a aquecer o ar, as cerejeiras florescem e enfeitam a grande sala que é a Cova da Beira, com magotes de pequenas pétalas rendadas, alvas e rosadas, numa festa para a vista e para o coração.

Mais algum tempo e transformadas em tapete macio, dão lugar ao vermelho vivo das cerejas, vergando com o seu peso os ramos mais frágeis, enchendo de cor o horizonte e anunciando a proximidade do Verão.

Quem somos...

Sempre que estou em cidades maiores e mais evoluídas do que aquela em que nasci, admiro e aproveito o que elas me oferecem de diferente, inspiro-me, revigoro forças, cresço.

No entanto, fica inalterável no carinho que dedico à minha, por mais que ela saia a perder na comparação.

Vou observando essa mesma característica nas pessoas que estão longe da sua terra.

Por mais pobres que fossem, por mais dificuldades que tivessem, querem sempre voltar, querem sempre poder fazer qualquer coisa por ela e as recordações que guardam dela, são sempre de um amor sem limites.

O que nos ligará para sempre ao lugar onde nascemos e crescemos?

O que nos faz ficar preso à paisagem que cercava a nossa casa, ao seu clima, às pessoas que conviveram connosco nos nossos primeiros anos, aos seus hábitos, até ao céu, ao Sol, à Lua e às estrelas que achamos sempre que têm outra cor e outro brilho?

O sabor do pão, da sopa, dos legumes e da fruta, que ouvimos tantas vezes referir, em qualquer lado, a propósito de coisa nenhuma, por pessoas que saboreiam na sua memória e sentem a diferença com o coração.

O cheiro dos campos, quando os eucaliptos volteiam com a brisa, quando as roseiras florescem e enchem o ar de doce perfume, quando se espalha no ar o odor quente do pão saído do forno que nos alimenta o corpo e o espírito, quando a chuva cai na terra seca em fim de tarde quente de Verão.

O nascer do Sol em tons dourados no firmamento e o seu esconder em laranja e vermelho de fogo.

A aragem macia e morna das manhãs de Primavera e o frio cortante e másculo que anuncia a chegada do Natal e nos recorda o conforto do abafo de lã e da lareira crepitante.

O cantarolar das rolas em árvore distante, o sussurrar da água que escorre de mansinho da fonte, o ladrar de um cão ao longe, guardando de estranhos a casa do seu dono, o cântico dolente de quem amanha o campo e deixa nele sangue e suor na hora em que as costas sentem o ardor do meio dia.

Existe em todas as terras, nos lugares mais esquecidos, no entanto o "nosso", tem um significado especial...

Será apenas um sentimento de posse, em que valorizamos o que nos pertence, ou será uma ligação visceral que nos faz sentir aonde pertencemos?

Quando saio de casa, vivo a partida com entusiasmo, mas quando regresso, o meu coração alegra-se e a minha alma aquieta-se.

A nossa terra, o nosso lugar, os nossos, permanecem dentro de nós e continuamos a amá-los, mesmo que tenham partido, que estejam distantes, que mudem, que deixem de existir.

Penso que são as nossas raízes que mantêm vivos os nossos ramos e alimentam as nossas flores e frutos, até os nossos espinhos.

Elas... somos nós.

22/07/2007

Fangio e...companhia.

O Manelito aprendeu a conduzir muito cedo. começou por ter um carrinho de pedais, depois um triciclo, depressa teve uma bicicleta e ainda não chegava aos pedais, já conduzia o carro.
Os meus pais viviam por cima da oficina e a minha mãe, certa vez, mandou o Manelito chamar o pai para almoçar. Ele foi, claro. O problema é que o pai não estava na oficina e ele, sem que alguém desse conta, (o Tó tomava conta dele, só que o Tó também gostava da bicicleta que andava a arranjar e distraía-se com frequência), pegou no carro e foi procurá-lo pelo Fundão. Teria 8 ou 9 anos.
Esticado para ver o caminho e chegar aos pedais, passou pelo polícia sinaleiro, que ficou mudo e quedo, de tão espantado.
Depois correu a avisar o meu pai, dizendo: "Oh Sr Salvado, olhe que eu até virei a cara para não ver..."
Por causa dessa mania, que os mais velhos tinham, de só poder conduzir quem tivesse carta, estávamos sempre dependentes. Para um miúdo como o meu irmão, isso era demais!
Num domingo, fomos os dois ao cinema (que Deus haja...). Tínhamos então 12 e 14 anos, no máximo. O meu pai, mandou-nos esperar à saída, pois voltava para nos buscar e levar para casa. Mas, como era habitual no Verão, todos os domingos havia visitas na quinta e o meu pai demorava-se. O Manelito, numa das suas decisões habituais, foi ao escritório, abriu a gaveta onde eram guardadas as chaves dos carros, tirou a do que estava estacionado à porta e chamou-me. Entusiasmado com as aventuras que vira na matinée, talvez, ali vamos nós direitinhos à quinta.
Em frente à adega, a meio do caminho, estava a brigada de trânsito. Mandaram-nos parar e quando viram as nossas caras, paralisaram por segundos. Então, enquanto um foi com o Manelito à adega telefonar para o meu pai, o outro, ficou junto do carro a guardar-me (imaginando que eu seria capaz de tudo... sei lá!).
Eu quase morri de medo... do meu pai.
O meu irmão foi dormir com os polícias à pensão onde estavam alojados, para não ir para o chilindró- já então funcionavam as cunhas- e na 2ª feira de manhã foi presente em Tribunal.
O meu pai teve de pagar uma multa elevadíssima, eu ouvi sermão e missa cantada e o Manelito foi o herói do dia, no colégio, por ter ido dormir com os polícias, ou seja, por ter sido apanhado a conduzir sem carta e... preso!

21/07/2007

O Zé e o Paulo.

Já falei muitas vezes no Zé da Mimila.
Aproveito a fotografia em que está com o meu pai, para lembrá-lo e ao seu irmão Paulo, que também já partiram. Cedo demais, infelizmente.
Ainda pequeno, o Zé ia a casa de umas pessoas amigas da mãe, a Mimila, e o Paulo, o irmão mais novo, quis ir com ele. A Mimila fez as recomendações da praxe... Porta-te bem, faz o que o Zé mandar e se te oferecerem lanche, aceita só quando o Zé disser. Não sejas gulotão!
Lá foram...
As senhoras da casa ofereceram um bolo com um aspecto de crescer água na boca, mas o Zé respondeu: "Não quero, obrigado".
O Paulo cumpriu com as determinações e quando lhe ofereceram o bolo, embora com voz baixa, agradeceu e não aceitou.
Pela segunda vez as senhoras ofereceram doces. O Zé estava determinado a sofrer e a fazer sofrer! Parecia de propósito. O temido "Não quero, obrigado", fez-se ouvir. E o Paulo, com dificuldade, repetiu o sacrifício.
Na terceira vez, antes que o irmão dissesse que não, olhou para ele e disse: "Oh Zé, quando é que dizes para eu aceitar?"
Estão agora a sorrir connosco, tenho a certeza. Um beijo.
Um beijo também para a Maria Eduarda, que tanto ama o Paulo e tanto nos tem amado a todos , por causa dele.

20 de Julho

Uma pequena homenagem ao meu pai, no dia do seu aniversário.
Aqui, na quinta que tanto adorava, com o Zé, a quem considerava como um filho, um irmão e um amigo.
A terra abençoada e generosa, o ar puro e a satisfação de uma vida cheia.
Levantava-se às 6 da manhã, todos os dias e até à meia-noite, nunca mais parava.
Os trabalhadores do campo chegavam às 8 horas e depois de dar as ordens, tomava então o pequeno almoço.
Costela do porco (nome dado ao entrecosto) frita com ovo estrelado, pataniscas de bacalhau, peixe em molho de escabeche, eram os pratos que preferia para acompanhar com uma caneca de café.
Era bem disposto por natureza.
Contava anedotas como ninguém. Mesmo a mais sensaborona, contada por ele, passava a ter graça. Acrescentava-lhe sempre uns pontinhos que faziam a diferença. Se a anedota não tivesse graça, as suas gargalhadas, no final, faziam rir as pedras.
Mas era muito distraído, muito esquecido.
Um dia, deu boleia a um amigo que precisava de ir a Lisboa. A pobre criatura esperou na hora e no sítio que tinham combinado para o regresso, mas o meu pai não aparecia. Depois de muitas horas, desesperado, lembrou-se de telefonar para o Fundão, donde o meu pai o atendeu...
Era procurado constantemente por quem precisava de um favor e a todos dizia que sim. As freiras duma Instituição que recolhia meninas sem família, pediram-lhe se lá mandava a camioneta, para fazerem a mudança para o hospital, onde ficariam instaladas até fazerem as obras no edifício. Claro que concordou... só se esqueceu que tinha de ir a Coimbra!
As freiras e as suas meninas trouxeram para a porta mobílias, roupas, tarecos e ficaram à espera. Ao almoço comeram pão, sentadas nos caixotes, ao lado do fogão. Telefonaram mil vezes na esperança de terem alguma novidade. Ao jantar já não tinham pão, nem força para voltar para trás, nem camioneta para fazer a mudança!
Às 10 horas da noite, o meu pai chegou de Coimbra, cansadíssimo. Quando lhe contámos dos telefonemas das religiosas, comeu a correr e foi ele mesmo fazer a mudança, trabalho que os empregados não tinham feito, dizendo que o meu pai não tinha deixado ordens para isso.
Dizia que não ia ao cinema porque não estava para pagar para dormir mal... Então levava a minha mãe à entrada e enquanto ela via o filme, ele trabalhava no escritório ou dava aulas. Já se imagina o que aconteceu... Acabado o trabalho, foi para casa. Vestiu o pijama a pensar que a minha mãe estava na cama e só então viu que ela não estava... que se esquecera dela.
Encontrou-a a meio do caminho, acompanhada por um casal amigo, furiosa por ter esperado uma boa hora.
As nossas lembranças estão tão vivas como no primeiro dia. Que saudades!
Feliz aniversário, pai!

15/07/2007

O par de... pescadores!

Mudar de ares fazia bem às crianças...
Como viviamos todo o ano perto da serra, o meu pai ia levar-nos à Nazaré, onde alugava uma casa no mês de Agosto, para apanharmos ares e banhos de mar.
Ele voltava para o Fundão e ia passar os fins de semana connosco.
Trabalhava muito para não nos faltar nada.
A ideia de nos vestirem como os nazarenos e de nos tirarem fotografias, não sei de quem era, mas penso que havia um fotógrafo que fornecia as roupas e fazia as fotos para as pessoas levarem de recordação. Outros tempos... agora toda a gente tem câmara de filmar!
Aqui parecemos mesmo os bonecos de loiça, que as lojas da beira mar vendiam aos turistas.
Bochechudos, com boquinha de passarinho, trajados a rigor, pés descalços, com todos os pormenores acautelados.
Veja-se por exemplo a mão do Manelito, dedo polegar na cinta... não é pouca coisa! E o barrete de pescador ao ombro?
Não parecemos lá muito animados, ou então... é concentração!!!
O meu irmão, antes de entrar para a escola, andou na D. Celeste, uma senhora que cuidava de crianças, onde brincava e aprendia já qualquer coisa. Eu também quis ir e ele levava-me pela mão, sem se descuidar nunca dessa sua tarefa.
Um dia, o Zé da Mimila encontrou-nos e falou-nos carinhosamente. À frase, "Olá Mimi, onde vais?" o Manelito respondeu: "Oh Zé, deixa-a lá, que ela vai muito rabugenta com o sono!"
Outra vez, cruzou-se com uns miúdos da sua idade, que andavam em zaragata. Primeiro pegou em mim, sentou-me no banco do jardim onde me mandou esperar e foi a correr meter-se na zaragata! Bons tempos!

14/07/2007

Manelito

Brincar na rua era possível. E esta era uma das principais ruas do Fundão, junto dos campos onde foi traçada a avenida. Ao fundo está a Auto-Transportes. Parece que foi há muito tempo, no entanto os carros e os prédios é que se multiplicaram depressa demais.
O carrinho de pedais já fora substituído e eu olhava a bicicleta com olhos maravilhados.
Era o meu irmão mais velho, o meu herói. Era sempre ele que tinha aquelas coisas fantásticas. (Além disso, não lhe atavam borboletas no alto da cabeça.)
Ele é que não gostava muito da proximidade da "miúda" e todas as formas eram boas para me mandar para casa. Muitas vezes a choramingar, pois tinha a mão lampeira.
Eu usufruía das "máquinas", quando ele se fartava, quando ganhava outras mais modernas. Por ser rapariga, davam-me tachinhos e roupinhas para as bonecas...
Era apaixonado por carros. Um dia deram-lhe um cavalo de balanço. Arrancou-lhe o rabo de sisal e encheu-o de água, dizendo que estava a meter-lhe gasolina. Era de papelão moldado, abriu-se logo em dois...
O meu pai foi viajar e trouxe-lhe um carro em miniatura, de metal pintado.
Quando pensaram que estava entretido com o carrinho novo, foram dar com ele a martelar o carro e a gritar:"Não sou capaz de estragar esta porcaria!". Estava habituado a ver o que tinham dentro, a tirar-lhes as rodas, enfim... a ver bem como eram.
Cedo aprendeu a conduzir carros a sério e a conhecer tudo sobre eles. Eu acabei por me refugiar nos livros que alimentavam a minha imaginação e me faziam companhia, sentindo saudades das personagens das histórias, quando estas chegavam ao fim. O Tonô, que chegaria à família por último, tinha a sua preferência na música.
Todos continuamos com os mesmos hábitos...

O meu cabriolet

Lá atrás, um carro mais moderno que o Balila... Vejo agora que este também tem a tal plataforma para subir. Pela minha idade, não era aquele que eu recordava, nem este sequer.

O carrinho era herança do meu irmão Manelito. É desta forma que passam as "manias" nas famílias!
Duvido que já soubesse andar em pé, no entanto já pegava no volante com estilo. Talvez me parecesse um carrinho de bonecas ou um ringue, objectos mais próprios para meninas... a verdade é que estou toda contente.
Ainda hoje tenho a mesma paixão por descapotáveis.
Os brinquedos do meu irmão chamavam-me mais a atenção do que as minhas bonecas.
Andar de carrinho, sempre era outra emoção!!!
Não podia afastar-me da porta da garagem, porque ainda era muito pequena. Não ter carta de condução não era problema, como contarei mais à frente...
Uma lembrança bem viva é o ódio pelos laços que me repuxavam os cabelos.
As mulheres começam desde cedo a sofrer por causa da aparência...