21/03/2009

Cova da Beira, Março em flor

Em Fevereiro a Serra expunha orgulhosa o seu manto de neve e apesar do frio gelar os ossos mal saíamos de casa, muitos turistas vieram aproveitar o Carnaval e fazer ski, dando uma vida efervescente à quietude da paisagem.
De um momento para o outro, o Sol transformou as encostas e deu-lhe um brilho diferente.
As cerejeiras estão em flor e a Gardunha está vestida de noiva. Continua branca, mas com ar mais sorridente.
A mutação das cores da minha terra é um espectáculo que sempre me impressiona.
Do branco imaculado da neve, no Inverno, depressa passa ao rosado das cerejeiras, macieiras e pereiras em flor, ao rosa forte das ameixeiras e ao rubro de fogo e amarelo alaranjado dos espinheiros.
Nos quintais das casas antigas, cameleiras sem idade brindam-nos, radiosas, com múltiplos arco-íris das suas camélias.
Nos arredores as pequenas flores do campo bordam tapetes nos chãos por lavrar.
A Cova da Beira está em festa, para dar as boas vindas à Primavera.
À tristeza de ver os campos agrícolas de 1ª qualidade abandonados às silvas e às ervas daninhas, contrapõe-se este deslumbramento de verde, salpicado de cores garridas, que o calor do Sol espalhou por todo o lado.
Nestes tempos, em que só ouvimos falar de crise, empanturram-se os nossos olhos de beleza e os nossos pulmões de ar perfumado, sem necessidade de regatear.
As forças renovam-se e como a Natureza, estamos prontos a florescer em entusiasmo e criatividade.

20/03/2009

Na quinta

Como eram conhecidos todos os ruídos e silêncios dos dias passados na quinta.
Muito cedo o galo experimentava o seu despertar de forma aguda e senhorial. Antes dele, no entanto, já mil passaritos chilreavam na nogueira do jardim, esperando que os pais lhes enchessem a barriga.
Com a chegada dos trabalhadores, a manhã enchia-se de vozes e de novos sons - portões, motores, alfaias que cantarolavam nos toques do ferro.
Faziam ruído na pedra miúda os passos caminho abaixo e vinha o silêncio de novo.
Na cozinha, a cafeteira que faria o café, as portas que se abriam e a água a correr em som de cristais tilintando suavemente.
Se chegava alguém, se ao longe cantavam, se caía uma maçã ao toro da macieira mãe, tudo se ouvia na quietude do campo.
No jardim alguém regava e o cheiro da terra era macio e fresco.
O cão Serra da Estrela dava um ar da sua graça de vez em quando, mostrando estar atento e lembrando a primeira refeição do dia.
Todo o dia os sons se iam repetindo e por isso eram tão familiares.
E se de madrugada os passarinhos eram os primeiros a dar a alvorada, à tardinha, depois de grande algazarra a aconchegar nos ninhos, ficavam quietinhos, quietinhos, dando ao entardecer uma calma que anunciava a noite.
As luzes, ao longe, brilhavam e só elas lembravam que outras pessoas viviam na Terra.
A ligeira aragem da noite, trazia o perfume das rosas abertas em ramalhetes no jardim e na varanda o repouso de um dia atarefado era a oração de agradecimento pela fartura e pela paz.
Em conversa amena, a contar de histórias recentes ou antigas, quase sempre com exageros e risadas, ou em dormitar meio alerta, as horas passavam depressa.
Estávamos todos, não havia temor nem saudade.

17/03/2009

A Beira e a sua música.

Oh Castelo Branco, Castelo Branco
Mirando o cimo da serra
Ai, mirando o cimo da serra!

Ai. quem nasceu lá em Castelo Branco,
Nao é feliz noutra terra
Ai, mirando o cimo da serra...

Eu nasci na beira, sou homem pequeno
sou como o granito bem rijo e moreno!
Eu nasci na beira, sou homem pequeno
sou como o granito bem rijo e moreno!

la la la la laaaa laaaa
la la la la laaaa laaaa
la la la la la laaaa
la la la laaa

Meu bem quem me dera, lá nos altos montes,
andar ao sol todo o dia
Ai, andar ao sol todo o dia...
Beber água fresca lá pelas fontes
Cantar como a cotovia
Ai, andar ao sol todo o dia

Coraçao da serra nao ama a cidade
Só na sua terra se sente à vontade
Eu nasci na beira, sou homem pequeno
Sou como o granito, bem rijo e moreno

la la la la laaala la la la laaaa
la la la laaa
la la la la laaaa


Se quiserem ouvir a música podem visitar este site http://www.jf-castelobranco.pt/turismo_lazer/default.asp?op=14

(In blog Mente Flutuante)

05/03/2009

Cartas de Amor




Também recebi cartas de amor. Quem diria?


Recebi cartas de amor de todas as maneiras e feitios.


Quando um rapaz gostava de uma rapariga, não tinha forma de lhe mandar um sms ou um email.


O telefone estava na sala para uso de toda a família, por isso os miúdos não se arriscavam a ligar para a amada e responder de lá o pai.

Mesmo assim, já muitos se aventuravam a ligar (e o contrário também é verdadeiro). Se atendesse o pai ou a mãe, perguntavam pela menina e diziam que era um amigo. Geralmente só faziam isto se soubessem que os pais não eram de se zangar.

Eram as cartas que levavam os sentimentos às amadas. Cartas escritas cuidadosamente, passadas a limpo vezes sem conta e cada palavra escolhida para impressionar.

É que essas cartas teriam de demonstrar o melhor possível o que os autores sentiam, sob pena de não virem a obter resposta.

Quando não gostávamos dos autores das declarações, tudo servia para fazermos troça, para ridicularizarmos o acto e o autor, para rirmos dias a fio.

Se o desgraçado usava alguma palavra mais elaborada, em vez desta servir para conquistar, era a sua sentença de morte.

Aconteceram muitas destas, comigo. Aliás, parecia que atraía aqueles que eu menos gostava! Os que me faziam suspirar, nunca me escreviam cartas de amor.

Havia um "Romeu" que passava dias inteiros à porta do café em frente da minha casa, a olhar para a minha janela. Como é que eu sabia, não é? Pois, eu ia para a janela...

Toda a gente sabia que ele morria por mim, mas ele não tinha coragem para confessar os sentimentos que o levavam a fazer sentinela na porta do café, fizesse frio ou calor, fosse de dia ou de noite. (Ele estudava no mesmo colégio que eu e não faltava às aulas, claro, pois eu também lá estaria). Um dia, passadas várias estações do ano, amigos comuns fizeram de correio e trouxeram-me uma carta do Romeu da porta do café.

No intervalo das aulas abri a carta, que me estava a intrigar de tão magrinha que vinha.

Era um simples cartão de visita com meia dúzia de palavras de amor escritas em letra miudinha.

Eu não queria acreditar! Um cartão de visita?

Quando começou a cena da troça e da risada, um deles veio em sua defesa, dizendo:

"Mas quem é que entende as mulheres? Ele mandou fazer os cartões e estava tão orgulhoso... agora vocês põem-se com essas coisas! Ele estragou uma série de cartões e tudo!"

Outra vez, o meu irmão fez de correio e trouxe-me uma carta de um amigo dele. Como eu já sabia de quem era, avisei as minhas amigas e fomos juntas lê-la.

Era muito elaborada, cheia de palavras caras e letra rebuscada. Ríamos como loucas de cada vez que ele falava num tal "laço férreo", que nós transformávamos em "laço de ferro".

No fim de todas as juras e promessas ele pedia: "Espero que esta carta fique só entre nós"

Ainda uma terceira. Não me lembro quem ma entregou, nem se eu já notara no arrastar da asa daquele pinga-amor. Sei que a carta vinha muito bem dobradinha, com várias dobras de canto, a fazer feitios, a letra muito pequenina e certinha, como se fosse de uma criança da primária, papel colorido e perfumado.

Parecia que nada haveria a apontar, embora aquelas miudezas todas me tivessem logo irritado.

Quando comecei a ler, lá estava a causa da risota.

Eu lia alto: " O meu coracao, bate tao forte quando te ve, que a respiracao para e a palpitacao faz saltar o peito". Meu Deus! Ao "passar a limpo" o rascunho, que deve ter feito dezenas de vezes, esquecera todas as cedilhas e toda a acentuação.

Durante imenso tempo rimos ao lembrar a "palpitacao do meu coracao".

Bom, só resta dizer que se estes erros viessem daquele que era especial para nós... até achávamos giro! Até seria romântico!

Adolescente é mesmo um caso sério.