05/03/2009

Cartas de Amor




Também recebi cartas de amor. Quem diria?


Recebi cartas de amor de todas as maneiras e feitios.


Quando um rapaz gostava de uma rapariga, não tinha forma de lhe mandar um sms ou um email.


O telefone estava na sala para uso de toda a família, por isso os miúdos não se arriscavam a ligar para a amada e responder de lá o pai.

Mesmo assim, já muitos se aventuravam a ligar (e o contrário também é verdadeiro). Se atendesse o pai ou a mãe, perguntavam pela menina e diziam que era um amigo. Geralmente só faziam isto se soubessem que os pais não eram de se zangar.

Eram as cartas que levavam os sentimentos às amadas. Cartas escritas cuidadosamente, passadas a limpo vezes sem conta e cada palavra escolhida para impressionar.

É que essas cartas teriam de demonstrar o melhor possível o que os autores sentiam, sob pena de não virem a obter resposta.

Quando não gostávamos dos autores das declarações, tudo servia para fazermos troça, para ridicularizarmos o acto e o autor, para rirmos dias a fio.

Se o desgraçado usava alguma palavra mais elaborada, em vez desta servir para conquistar, era a sua sentença de morte.

Aconteceram muitas destas, comigo. Aliás, parecia que atraía aqueles que eu menos gostava! Os que me faziam suspirar, nunca me escreviam cartas de amor.

Havia um "Romeu" que passava dias inteiros à porta do café em frente da minha casa, a olhar para a minha janela. Como é que eu sabia, não é? Pois, eu ia para a janela...

Toda a gente sabia que ele morria por mim, mas ele não tinha coragem para confessar os sentimentos que o levavam a fazer sentinela na porta do café, fizesse frio ou calor, fosse de dia ou de noite. (Ele estudava no mesmo colégio que eu e não faltava às aulas, claro, pois eu também lá estaria). Um dia, passadas várias estações do ano, amigos comuns fizeram de correio e trouxeram-me uma carta do Romeu da porta do café.

No intervalo das aulas abri a carta, que me estava a intrigar de tão magrinha que vinha.

Era um simples cartão de visita com meia dúzia de palavras de amor escritas em letra miudinha.

Eu não queria acreditar! Um cartão de visita?

Quando começou a cena da troça e da risada, um deles veio em sua defesa, dizendo:

"Mas quem é que entende as mulheres? Ele mandou fazer os cartões e estava tão orgulhoso... agora vocês põem-se com essas coisas! Ele estragou uma série de cartões e tudo!"

Outra vez, o meu irmão fez de correio e trouxe-me uma carta de um amigo dele. Como eu já sabia de quem era, avisei as minhas amigas e fomos juntas lê-la.

Era muito elaborada, cheia de palavras caras e letra rebuscada. Ríamos como loucas de cada vez que ele falava num tal "laço férreo", que nós transformávamos em "laço de ferro".

No fim de todas as juras e promessas ele pedia: "Espero que esta carta fique só entre nós"

Ainda uma terceira. Não me lembro quem ma entregou, nem se eu já notara no arrastar da asa daquele pinga-amor. Sei que a carta vinha muito bem dobradinha, com várias dobras de canto, a fazer feitios, a letra muito pequenina e certinha, como se fosse de uma criança da primária, papel colorido e perfumado.

Parecia que nada haveria a apontar, embora aquelas miudezas todas me tivessem logo irritado.

Quando comecei a ler, lá estava a causa da risota.

Eu lia alto: " O meu coracao, bate tao forte quando te ve, que a respiracao para e a palpitacao faz saltar o peito". Meu Deus! Ao "passar a limpo" o rascunho, que deve ter feito dezenas de vezes, esquecera todas as cedilhas e toda a acentuação.

Durante imenso tempo rimos ao lembrar a "palpitacao do meu coracao".

Bom, só resta dizer que se estes erros viessem daquele que era especial para nós... até achávamos giro! Até seria romântico!

Adolescente é mesmo um caso sério.



1 comentário:

nuno medon disse...

Olá! Imagino que tenhas tido muitos apaixonados e aposto que muitos deles ficaram com torcicolos por passarem a vida a olhar para ti...hihi...beijos