13/07/2008

O fim anunciado

Nasci no Fundão, onde estudei até terminar o liceu.
Sou filha, neta e bisneta de fundanenses.
No entanto, quando me interrogo sobre hábitos, costumes, palavras e lugares da minha terra, sinto que nada sei.
Andamos na escola, no colégio e saimos da nossa terra, para estudar e exercer uma profissão, sem sabermos interpretar as nossas raízes.
Tenho pena, porque à medida que procuro o que ficou para trás, vejo como tantas coisas se perdem, desaparendo para sempre, não só da vista, mas também da memória das pessoas.
E são essas pequenas histórias que originaram o que somos e fizeram a nossa História.
Cada cidade vai evoluindo, deitando por terra o que é velho e a identifica, para dar lugar a um novo descaracterizado e igual em todas as outras.
É como se lhes vestissemos uniforme.
Poderíamos evoluir sem perder o que existe, restaurando e preservando as características da nossa terra, para as darmos a conhecer aos nossos netos.
As casas de pedra dão lugar aos prédios de andares, as lareiras, aos aquecimentos centrais, os fornos a lenha comunitários, aos bolos de fábrica congelados e preparados para fazer na hora.
Tudo se moderniza e a nossa identidade desaparece.
Já não há festas populares com arraial, nem artesanato local. Os doces, os licores e as compotas são feitas em indústria própria e com as precauções da longa duração. Os pratos tradicionais, envergonham-se da sua simplicidade e enfeitam-se com bijuteria que lhes dá um ar estranho.
O cabrito no forno deixou para trás a assadeira de barro e aparece na mesa em pirex brilhante e transparente. O feijão verde frito com polme de ovo, está ausente das merendas e presente o frango assado no momento. O esparregado compra-se congelado, pois migar a rama de nabo, cozê-la, escorrê-la e fazer com ela o esparregado frito no azeite com um dente de alho, a que se junta o sal, a farinha e o vinagre, dá trabalho e tira tempo, que se pode utilizar em tarefa menos enfadonha.
A tradição e o sabor... esses deixam de ser importantes. Importante é ver a telenovela no horário anunciado, ou ir ao café na hora certa.
Os pimentos já estão assados e em frascos adequados. A massa tenra para os pastéis, já está confeccionada e em caixas de papelão, nas arcas dos supermercados. Os ovos verdes, quase desapareceram das entradas e já ninguém conhece o botelho frito. O arroz doce já não tem corações desenhados com canela.
Os meus filhos adoram ovos verdes, mas não os sabem fazer. (Porque é que se chamam verdes, perguntaram-me. Porque levam muita salsa picada, respondi.)
E assim ficam para trás as nossas coisas e tomam o lugar delas hamburguer, pizza e donuts.
Tudo tem um fim. Até nós teremos.

1 comentário:

Anónimo disse...

Bonito. E bem verdade!

Boa continuação!

Sol*